sexta-feira, 21 de março de 2008

FELGUEIRAS É O CONCELHO COM MAIOR SUBIDA DE DESEMPREGO NOS ÚLTIMOS CINCO ANOS

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Responsável por metade das exportações nacionais de calçado, Felgueiras é seguido pelos concelhos de Resende e Cinfães. Uma viagem ao país do desemprego real.

A madrugada é o período mais difícil dos dias que Rui está a viver. “Foram 35 ou 36 anos a levantar-me às cinco e meia da manhã. Chega aquela hora e fico exaltado.” “Aquela” era a hora a que Rui Martins, tintureiro de Felgueiras, saía para trabalhar na Fábrica da Bouça. A chegar aos 50, com contrato de trabalho suspenso, à espera de uma definição sobre o futuro da empresa, mata os dias com a actividade de radioamador a que há muito se dedica. Mas já está a ficar saturado de estar em casa.


Rui, 35 anos na Bouça, o nome porque ainda é mais conhecida a têxtil Antero Teixeira da Cunha, para onde entrou aos 14, está em casa há mês e meio, desde 28 de Janeiro. Há mais tempo desempregada está Maria de Lurdes, a mulher, 50 anos, que perdeu o emprego quando a empresa de calçado Pinfel faliu em Julho de 2006, deixando cerca 120 pessoas sem trabalho. Têm ambos a quarta classe, ambos passaram a vida inteira com ordenados na fasquia do salário mínimo.


Olhar para a família de Rui e Maria de Lurdes – que também trabalhou nos têxteis até há uns doze anos, e após uma primeira fase de desemprego se mudou para o calçado – é ver um retrato social e empresarial do concelho do país onde o rácio do desemprego mais subiu nos últimos cinco anos, de acordo com uma análise do PÚBLICO sobre a evolução do desemprego entre o início de 2002 e finais de 2007.

Rui está fora do têxtil, Maria de Lurdes do calçado, o mais importante sector de actividade de Felgueiras, onde um dos filhos também já trabalhou e que dá que ganhar a duas noras. Os outros dois filhos andam, como muitos de tantos concelhos do Norte, na construção civil em Espanha, para onde já se tornou comum o vaivém de carrinhas com trabalhadores no início e fim da semana. “Qualquer servente em Espanha ganha 1200 euros”, afirma Carlos José, dirigente do Sindicato dos Trabalhadores dos Têxteis, Vestuário, Calçado e Curtumes.

“Começa a haver muitos casos assim, de marido e mulher em casa”, dirá José Quintela, funcionário do sindicato. Como vivem em casa cedida pelos pais de Rui, e não têm compromissos com bancos, a situação do casal de operários não será das mais dramáticas, mas “é lamentável chegar aos 50 anos e passar por estas fases”, desabafa, voz pausada, como se procurasse as melhores palavras, nesta tarde de inverno cheio de sol em que Maria de Lurdes foi a Valongo, a uma consulta com um filho.

O número de desempregados neste concelho do distrito do Porto subiu de 1846 em Janeiro de 2002 para os 3944 de Janeiro último que representam cerca de dez por cento da população entre os 15 e 64 anos. Não é que o desemprego seja muito visível a olho nu, como afirma o sindicalista Carlos José. “Se der uma volta pelo concelho vê um número muito reduzido de pessoas ‘ao alto’, as pessoas não saem muito da sua órbita, não é lugar onde as pessoas se exponham.”
João Manuel Rocha – Jornal o Publico

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